A aprovação da Resolução nº 32/2010, pela Assembleia da República, na linha de muitas das propostas dos referidos congressos e encontros de mulheres da "Diáspora", é reveladora de uma nova percepção da importância da componente de género nas políticas da emigração.
I -AFLORAMENTOS DA "QUESTÃO DE GÉNERO" NAS POLÍTICAS DE EMIGRAÇÃO
(Medidas discriminatórias, proibitivas ou limitativas)
Tradicionalmente, emigrar era uma "aventura masculina". As Portuguesas viram-se, desde os séculos XVI e XVII, especialmente limitadas no que hoje diríamos o seu direito à emigração ou à reunificação familiar. E se até ao regime nascido no 25 de Abril de 1974 nunca foi verdadeiramente livre, para todos, a saída do país, o certo é que os obstáculos foram sempre maiores para as mulheres.
No período da "expansão", nem para acompanhar os maridos isso lhes era, em princípio, permitido - só a título excepcional e por favor régio. Política diametralmente oposta foi, por exemplo, seguida em Castela, que sempre privilegiou a emigração de casais para as colónias da América do Sul. (Boxer, 1977:34) Entre nós, houve, sim, algumas excepções determinadas pela vontade de promover o enraizamento de populações europeias em determinadas regiões do Império. Com essa finalidade, saíram para a África e o Oriente, as chamadas "órfãs de El-Rei" - jovens recolhidas em orfanatos, que eram dadas em casamento a soldados e outros potenciais povoadores, mediante um determinado dote (terras de cultivo, empregos públicos...). Também o povoamento por casais foi promovido, em casos contados, ao longo de diferentes épocas, mas nunca de forma generalizada e sistemática. (Boxer, 1977: 78-84)
Mais tarde, no século XIX, em contexto puramente migratório, poderemos apontar um caso particularmente bem documentado de emigração familiar para as antigas Ilhas Sandwich, enquadrada num acordo bilateral entre os reinos de Portugal e do Havai. A partir da Madeira e dos Açores aportaram nessas ilhas do Pacífico, muitas mulheres e homens, que quase sempre levavam consigo uma prole numerosa, e deixavam a terra sem esperança de voltar. (Felix, 1978: 28-30)
Porém, à margem de qualquer incitamento ou facilitação do processo, grande número de mulheres iam juntar-se a maridos e familiares, por sua vontade, contrariando estratégias, leis e determinações das autoridades. Em oitocentos e no início do século seguinte, acentuou-se a tendência para o aumento das que assim reagiam à solidão em que se viam, partindo ao encontro dos homens, em regra, depois de eles estarem integrados na nova sociedade - o que era causa de desmedida preocupação dos especialistas neste domínio, tanto de académicos como de decisores e responsáveis pela execução das políticas de emigração. (1)
São representativas do pensamento da época as opiniões de investigadores, como Afonso Costa e Emygdio da Silva. Para o primeiro, a emigração feminina é mesmo considerada uma "depreciação do fenómeno migratório", o que tem de se compreender na lógica de considerar o emigrante, essencialmente, como fonte de divisas. Nas suas próprias palavras: "[...]é quando a família fica na Pátria que ele envia mais regularmente as suas economias". (Costa, 1913:182). Para o segundo, o êxodo das portuguesas era "uma constatação tremenda". Reportando-se a este fenómeno no início do século XX, entre 1906 e 1913, um período em que se regista um crescimento de 127% das saídas de mulheres, os perigos para que aponta são, antes de mais, a "desnacionalização" e a "cessação de remessas". (Silva, 1917:132).
Não surpreende, assim, que a discriminação entre os sexos fosse evidenciada na própria definição de emigrante: o passageiro homem que viajava na 3ª classe dos navios, e a mulher que seguisse desacompanhada, qualquer que fosse a classe escolhida para o transporte, ficando sujeita a todas as restrições que a qualificação implicava... Essa diferença de tratamento denunciava a clara consciência da "questão de género", a constatação da influência da presença da mulher no curso do projecto migratório, no seu destino final, com maior probabilidade de uma opção pela integração e pelo não retorno – a suscitar a intervenção autoritária, vertida em medidas jurídicas e práticas administrativas. De facto, a emigração familiar reforçava, como ainda hoje indubitavelmente reforça, a tendência para a fixação definitiva no país de acolhimento. E não se perspectivava outro tipo de ganho, que pode ser maior e mais duradouro do que a entrada de divisas para equilibrar as contas com o exterior. Por exemplo, a criação de comunidades, portuguesas pela cultura e pelo afecto, (indissociáveis de uma forte componente feminina), que eram, então, pouco mais do que ignoradas ou depreciadas como meros “guetos” transitórios, onde se enclausurava, por escolha própria, a primeira geração de emigrantes.
Haveria também, já, o assomo de alguma preocupação com a situação de especial vulnerabilidade das mulheres, pelo receio de que sós, em terra estranha, pudessem ser vítimas de exploração no trabalho.
O que obviamente não havia, ainda, era a ideia de que as mulheres, tal como os homens, têm direitos - e muito menos a aceitação de que pudessem ter, neste como noutros domínios, direitos absolutamente iguais.
II - DA IGUALDADE NA LEI ÀS DESIGUALDADES DE FACTO
1 - Em 1974, depois da revolução do 25 de Abril, a liberdade de circulação dentro e para fora do território nacional é restabelecida (ou melhor, estabelecida…) e vem a ser consagrada na Constituição de 1976. Esse foi um tempo de tão assertiva afirmação de princípios, que levou a uma natural sobrevalorização do plano puramente jurídico, como se as leis vanguardistas tivessem, de per si, o poder de transformar ditames em factos do quotidiano. Assistimos, por isso, a uma diluição da problemática feminina, perante leis que as não discriminavam, com o que isso representava de positivo, face ao passado, mas também com a faceta negativa de ser "padronizado” no masculino todo e qualquer trajecto migratório - assim se tornando opaco, e permanecendo desconhecido, o que especificamente dizia respeito às mulheres migrantes.
No "país do território" sentiu-se a necessidade de ir abrindo caminho à igualdade efectiva entre os sexos, para além da mera proclamação de princípios, dando às políticas uma base operacional própria em serviços ou departamentos com competências genéricas ou sectoriais (a "Comissão para a Igualdade", cuja designação foi variando, sem verdadeiras rupturas na sua actuação, exemplifica aquela primeira categoria, a Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego - CITE - a segunda).
Pelo contrário, no "Portugal da Diáspora" a atitude foi de descaso das autoridades nacionais no respeitante à situação das portuguesas no estrangeiro, às eventuais singularidades da sua integração no mercado de trabalho e na comunidade de destino, não obstante a Constituição, no artº. 9º, e, a partir da revisão de 1997, também no artº 109º, impor ao Estado a tarefa de promover da igualdade entre os sexos no que respeita á participação cívica e política, sem restringir essa incumbência ao território nacional. Descaso tanto mais criticável quando se receava que as emigrantes fossem, na sociedade de acolhimento, duplamente discriminadas, como mulheres e como estrangeiras - ainda por cima, numa conjuntura em que se acentuava a “feminização” da emigração, devido à crise económica, que viera interromper a chamada de trabalhadores activos e apenas tolerava movimentos migratórios para efeito de reagrupamento familiar.
A partir da meia década de 70, a percentagem de mulheres nas comunidades do estrangeiro aproximava-se da dos homens. E, apesar das restrições que inicialmente, um pouco por todo o lado, se colocavam à sua actividade profissional, a maioria acabou por aceder, como os homens, ao mercado de trabalho, ainda que não, normalmente, no mesmo tipo de empregos. Em qualquer caso, a possibilidade de profissionalização, logo aproveitada, maciçamente, converteu-se numa autêntica via de emancipação destas mulheres, dando-lhes importância do ponto de vista económico, social e cultural, e, do mesmo passo, independência e igualdade, quando não supremacia dentro da família. Face às mulheres não emigrantes, as que tinham saído do país gozavam, em regra, não só de maior prosperidade económica, como de um estatuto profissional e familiar privilegiado (Leandro, 1995:51). E mesmo em relação aos homens emigrados nem sempre perdiam no confronto. (2)
A tese da "dupla discriminação" perdeu o seu carácter de evidência. Se existe, sob diversas formas, acaba sendo, frequentemente, superada. Conclusão a que se chega quando se perspectiva a vida das emigrantes ao longo de décadas - como realidade complexa e dinâmica - e quando se entra em linha de conta com a sua provável situação em caso de não emigração. (Aguiar, 2008: 1257)) Em boa verdade, o sucesso, no longo prazo, da geração de 60 e 70 (a do "salto" para a Europa...) não é só da metade masculina, mas também da feminina (Leandro, 1998: 22). E às próprias mulheres se fica a dever, não ao sustentáculo moral e material ou a quaisquer formas de ajuda do seu país. (3)
2 - No aspecto legislativo, é de salientar que, na década de 80, subsistia ainda, contra a letra e o espírito da Constituição de 1976, uma capitis diminutio das mulheres portuguesas - na maioria mulheres emigrantes, embora não pelo facto de o serem, mas sim pelo de residirem num lugar geográfico mais propício ao convívio com não nacionais: refiro-me à lei que retirava a nacionalidade portuguesa, automaticamente, às cidadãs que casassem com estrangeiros. A Lei nº 37/81 veio permitir-lhes não só conservarem a nacionalidade, independentemente da do cônjuge, como transmiti-la, em igualdade de condições, à sua descendência e recuperar o estatuto de cidadania portuguesa perdido "ex lege". No entanto, note-se, a reaquisição desse estatuto facilitada e com eficácia retroactiva, só viria a ser assegurada pela Lei nº1/2004 de 15 de Janeiro, ou seja, cerca de trinta anos depois da revolução do 25 de Abril... (4)
3 - Olhámos a emigração do passado, mas, tratando-se de um movimento que nunca cessou e reassumiu, sobretudo na última década, uma desmesurada dimensão, convém, igualmente, considera-lo no presente. Embora isso não tenha, ainda, reconhecimento bastante, há, de facto, um recrudescimento das vagas migratórias, no conjunto menos dramáticas, menos visíveis do que as das décadas de 60 e 70, e, também, mais difíceis de quantificar na sua exacta extensão, porque se dirigem, em larga medida, a um espaço europeu de liberdade de circulação... As mulheres estão envolvidas no processo por vontade e direito próprio, autonomamente, e, tal como os homens, são cada vez mais qualificadas. Segundo o sociólogo Eduardo Victor Rodrigues "[...] já não correspondem ao paradigma da mulher da aldeia que sai para acompanhar o marido; são bastante escolarizadas e procuram melhores condições de vida". (5)
É um êxodo, também no feminino, que escapa ao paradigma tradicional e que é necessário conhecer melhor, e apoiar, como reivindica a Assembleia da República numa Resolução, aprovada no primeiro trimestre deste ano, que irei expor adiante.
Algum trabalho tem sido desenvolvido nesta área, em estudos de cientistas, a título individual, em projectos de centros de investigação, e também em exposições e debates de congressos, encontros, seminários, como é o caso do que aqui nos reúne. Fala-se em “congressismo”, para englobar este último tipo de iniciativas. É uma palavra que não encontraremos em muitos dicionários, mas que permite classificar, expressivamente, um instrumento, que tem tido influência basilar na elucidação e na procura de respostas para a "questão de género", em Portugal, no nosso século, tal como noutros países e noutros tempos, pelo menos desde que Elizabeth Caddon Stanton fez história do feminismo nos lendários encontros de Seneca Falls.
Nos anais da luta feminista, como nos da luta pela valorização do papel da Mulher no universo da emigração, o "congressismo", assim entendido, tem podido concertar a vertente académica com a da partilha de experiências vivenciais, visando a acção concreta e a mudança. Em Portugal, no presente, através dele se tem vindo a executar uma parte do programa de governo para as comunidades portuguesas do estrangeiro, em matéria de género. (Aguiar, 2009, 41) Os “Encontros para a Cidadania foram anunciados e efectuados nesse preciso enquadramento, a partir de 2005. (6)
4 - Um parêntese, para salientar a absoluta necessidade de recorrer ao conhecimento científico a fim de fundamentar novas políticas de emigração. É uma evidência nem sempre vista como tal. Em largos períodos do passado recente, governo e universidades viveram dissociados, com os efeito que se conhecem, em particular a tardia reacção das autoridades perante inesperados reinícios de surtos migratórios e, muitas vezes, casos graves de exploração dos expatriados, dos quais a opinião pública e o governo tomam conhecimento, em simultâneo, pela imprensa... Por isso se regista como positiva a retoma de colaboração, que, previsivelmente, permitirá inspirar e delinear decisões e medidas de pronto e atento acompanhamento de movimentos emergentes. Exemplo de uma relação mais estreita entre estes dois mundos, o académico e o político, é o estabelecimento da parceria entre a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas e um centro de investigação universitário (do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa - ISCTE), para levar a cabo um projecto de análise e caracterização do fenómeno migratório, através do "Observatório da Emigração". (7)
Resta saber em que medida se preocupará o “Observatório” com a problemática de género e tornará mais ou menos dispensável a recomendação, repetidamente feita ao governo, de criar um observatório das migrações femininas. (8)
III - AS PRIMEIRAS INICIATIVAS DE AUDIÇÃO DE MULHERES EMIGRADAS
1 – Como vemos, foi regra geral, até data recente, a indiferença dos Governos por tudo o que respeita às particularidades da integração das emigrantes no sector profissional e no universo associativo - este dirigido e representado - nunca é demais salientá-lo… - quase em exclusivo, por homens, no período que se seguiu à proclamação jurídica da igualdade plena entre os sexos, nomeadamente no Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), desde 1981.
Dos grupos que tradicionalmente viam, pela especificidade das suas situações, supostamente no seu próprio interesse, dificultada a saída do país, mulheres e jovens, só estes últimos têm estado no centro da atenção dos políticos, antes de mais, através da organização de programas de ensino da língua e cultura portuguesas, mas também de acções de intercâmbio, estágios de formação profissional, encontros, debates - do que designamos por "congressismo". Na última reestruturação do CCP – Lei nº 66-A/2007 de 11 de Dezembro – o legislador foi mais longe com a instituição de um “Conselho Consultivo da Juventude”, com competência “nas questões relativas à política da juventude para as comunidades portuguesas”, e nas “questões relacionadas com a participação cívica e integração social e económica dos jovens emigrantes e luso-descendentes nos países de acolhimento”.
Nada de comparável está previsto para o associativismo feminino... Alguns responsáveis políticos justificarão esta diferença com a opção pela "paridade" de género no CCP, nos termos que, adiante, explicitaremos, em alternativa a esta outra forma de dar representação específica a determinados segmentos ou grupos das comunidades. Julgo, porém, válido contra-argumentar que a verdadeira paridade é um objectivo a prazo incerto, provavelmente a longo prazo, pelo que, no imediato, a metade feminina da emigração ficará longe de ter a metade dos assentos do Conselho.
Por outro lado, a vertente de "género" não tem sequer sido valorada - e deveria sê-lo… - nos critérios de concessão de apoios do Estado às iniciativas de instituições da "Diáspora", parecendo contar pouco o facto de o crescimento da rede de clubes e centros culturais, em que se estruturam as comunidades, se dever, em muito, à participação de famílias inteiras, com as mulheres a assumirem, funções simétricas, no círculo estreito do lar e no círculo alargado na colectividade - neste permanecendo, quase sempre, uma discreta "dona da casa", que se encarrega da arte da culinária, da decoração, da organização dos bastidores da festa e do convívio quotidiano, factores insubstituíveis de agregação e de desenvolvimento... Um papel vital, mas redutor, de que se vai libertando, para exercer, alternativa ou cumulativamente, quaisquer outros - para já, mais em determinados países do que na generalidade do universo da Diáspora portuguesa.
Estamos num domínio da vida em sociedade em que, segundo a opinião dos que defendem, em absoluto, o princípio da não interferência, o Estado não deve intrometer-se. Todavia, não é disso que se trata – trata-se não de condicionar ilegitimamente a independência das instituições mas de velar pela aplicação de direitos fundamentais, que nenhuma tradição ou costume, que invoque, pode subverter. Há que incentivar boas práticas dentro de cada associação portuguesa do estrangeiro, apelando à vivência igualitária da cidadania, como, de resto, quer o próprio legislador constitucional. A verdade é que, com recurso aos mais variados pretextos, sucessivos governos, no pós 25 de Abril de 1974, descuraram a prossecução do objectivo da igualdade de acesso a actividades cívicas e políticas, no espaço da emigração.
2 – A vontade de romper este quadro de inércia foi divulgada, logo no início de funções, pelo Secretário de Estado António Braga no 1º Encontro da Cidadania, em Novembro de 2005, ao falar do “desígnio”, que presidia a essa reunião de " [...] retomar da questão de género, que tem andado esquecida ao longo dos anos […]", e ao admitir que "Portugal não tem tratado do papel da mulher nas comunidades de acolhimento à luz dos seus direitos de participação cívica, cultural e política".(9)
Era, de facto, um "retomar" a questão de género, que havia tido, apenas, um momento breve de afirmação, na meia década de 80. No arranque desta primeira fase está uma recomendação do CCP, que se fica a dever à visão e sensibilidade de uma das raras mulheres que nele tinha voz. O Conselho, criado pelo Decreto-lei nº 373/80 de 12 de Setembro, órgão consultivo do governo, era eleito de entre os líderes das associações e formado, como disse, na sua quase totalidade, por homens, à imagem do próprio dirigismo associativo de então. Maria Alice Ribeiro, "mulher excepção", na qualidade de representante dos media do Canadá no CCP, obteve, em fins de 1984, na reunião regional desse órgão, realizada em Danbury, Connecticut, consenso para a sua proposta de convocação de um congresso mundial de portuguesas emigradas. (10)
A Secretaria de Estado da Emigração aceitou o desafio e o "1º Encontro de Mulheres no Associativismo e no Jornalismo" aconteceu no ano seguinte.
Trinta e cinco portuguesas dos cinco continentes foram convidadas, através das embaixadas e consulados de Portugal, a apresentar comunicações: jornalistas, professoras, investigadoras, sindicalistas, empresárias, estudantes, dirigentes de colectividades… Mulheres de formação muito diversa, todas elas activas das suas comunidades - no ensino, na acção social, no teatro, na dança, na música, no desporto... (11).
A selecção desse grupo de personalidades convidadas não teve tanto a preocupação de assegurar um equilíbrio regional entre as grandes concentrações de emigrantes, como de reflectir a participação das mulheres, tal com à época se verificava, em comunidades com origem, idade e tradições de organização e acção femininas muito diversas. Assim, com uma representação mais em qualidade do que em quantidade, tendo como interlocutores vários membros do governo da República e dos governos regionais dos Açores e da Madeira, e, também, da sociedade civil, se realizou, em Junho de 1985, em Viana do Castelo, a reunião matricial.
1985 era o ano de encerramento da "Década" das Nações Unidas dedicada à Mulher, facto que não havia sido determinante na recomendação do CCP, embora a coincidência tenha contribuído, a par do carácter inédito da iniciativa portuguesa, para que o "Encontro" tivesse o alto patrocínio da UNESCO. Não havia, realmente, memória de organização, por parte do governo de um país de diáspora, de um forum semelhante, apesar de, na altura, alguns, poucos, já disporem de mecanismos para audição geral dos seus expatriados.
A menção do Conselho das Comunidades torna-se incontornável no historial deste congresso, não só por lhe pertencer a autoria da proposta da convocatória, mas também porque o desenrolar dos trabalhos se inspirou nos seus moldes de debate e decisão, contou com parceiros oficiais do mesmo nível e fez apelo ao envolvimento do associativismo e dos media (precisamente como sucedia no próprio "Conselho").
Assim, as "conselheiras", a título informal, puderam dialogar com os mais altos responsáveis pelas políticas para a emigração, transmitir-lhes os seus pontos de vista e, seguidamente, deliberar, entre si, conclusões e recomendações.
Nas conclusões gerais, realçaram (como António Braga haveria de fazer, duas décadas depois – sinal da longa paragem do processo então encetado... - " […] a pouca audição que tem sido dada às mulheres portuguesas no estrangeiro". E, naturalmente, no final dos trabalhos quiseram enfatizar " […] o entusiasmo e a expectativa gerada pelo Encontro". (12)
Para audição futura, e para a chamada das mulheres à intervenção cívica, propunham a criação de uma associação internacional própria.
Na escolha de temas para debate, no modo de historiar o passado e olhar o presente, e nas recomendações para a mudança de um "estado de coisas", colocaram a tónica em dois grandes objectivos indissociáveis: o de serem consultadas sobre a realidade global das comunidades e o seu futuro, tal como o viam e queriam legitimamente influenciar; o de repensarem o seu próprio papel na família, na vida colectiva, no trabalho profissional e no associativismo, a fim de passarem à execução de projectos de mudança.
Nos anos que se seguiram, a estrutura internacional autónoma para que apontavam não viria a formar-se – por falta assunção da liderança, decerto por causa da dispersão, da distância, das dificuldades de contacto.
Mais pragmática e fácil de implementar teria sido a proposta de inclusão da problemática feminina na agenda do CCP, para convocatória de novas reuniões... Em 1987, perante o impasse em que se caíra, a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas enveredou por essa via, no contexto de uma reestruturação do CCP. Previa-se a organização, não na orgânica, mas na órbita do "Conselho" - por simples despacho do presidente do CCP, que era, então, um membro do Governo - de várias "conferências" temáticas, em áreas prioritárias, entre elas, uma "Conferência para a Promoção e Participação de Mulheres Portuguesas do Estrangeiro". (13)
A queda e substituição desse Executivo, no verão de 87, implicaram a marginalização imediata do CCP, enquanto organismo de consulta, e as "conferências" não foram nunca convocadas, tal como os plenários do "Conselho".
2- Cerca de uma década depois, a memória das expectativas geradas em 1985 e a convicção de que seria ainda necessário e possível satisfaze-las, levou um pequeno número de participantes do "Encontro" de Viana, a constituir uma associação que reclamou a herança desse projecto em demorada hibernação: a "Mulher Migrante - Associação de Estudo, Solidariedade e Cooperação".(Gomes, 2007: 99)
A "Mulher Migrante" manifestou, desde logo, uma vontade de cooperação com governo e com ONG’s interessadas na promoção de estudos e de reuniões ou Congressos periódicos, a fim de fazer o ponto da situação das mulheres migrantes e de abrir caminhos para a igualdade.
De algum modo, ainda que sem uma base institucional, no seu modo de funcionamento, inspira-se no modelo do CCP originário, que tinha raízes na comunidade (em sentido orgânico) e se inseria numa estratégia de cooperação "Estado -Sociedade Civil". Não será de todo excessivo, ver, não na "Mulher Migrante", em si, mas na "plataforma de diálogo" que, com o governo e instituições ou personalidades das comunidades do estrangeiro foi sendo mantida, essa vocação de se converter numa espécie de "Conselho" no feminino, (assinaladamente no período em que decorreram os "Encontros Para a Cidadania - a Igualdade entre Mulheres e Homens". (14)
IV - OS "ENCONTROS PARA A CIDADANIA", PARADIGMA DE MOBILIZAÇÃO PARA A IGUALDADE ENTRE MULHERES E HOMENS" (2005-2009)
Em 2005, por altura do 20º aniversário do "Encontro" de Viana, a "Mulher Migrante" apresentou ao Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas uma proposta de comemoração dessa efeméride, através da retoma de audições sistemáticas das emigrantes, inseridas numa estratégia de mobilização para a intervenção cívica. Proposta que ele aceitou, patrocinando, de uma forma sistemática, campanhas, com esse escopo, nas maiores comunidades da Diáspora, numa acção conjunta com ONG´s de Portugal e das comunidades, que foram levadas a cabo nos referidos "Encontros", realizados, sucessivamente, na América do Sul, em Buenos Aires (2005), na Europa, em Estocolmo (2006), no Canadá, em Toronto (2006), na África do Sul, em Joanesburgo (2008) e nos EUA, Berkeley (2008).
O Governo fez-se representar em todas essas reuniões, a alto nível político - pelo Secretário de Estado das Comunidades, António Braga, ou pelo Secretário de Estado, que tutelava a "Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género" Jorge Lacão. (15)
A Jorge Lacão coube, na "Conferência para a Igualdade", em Toronto, fazer uma ampla explanação doutrinal sobre as novas "políticas de género" para a emigração. Na abertura dessa Conferência, assegurou, com meridiana clareza, que "{…]as tarefas fundamentais do Estado Português" para a promoção da igualdade se não podem limitar à acção junto das portuguesas e dos portugueses residentes no território[…]. Segundo ele, a letra da Constituição não deixa margem para dúvidas, ao não excepcionar o campo de actuação além fronteiras, como é, aliás, esclarecido no Programa do XVII Governo Constitucional. O Governo compromete-se a "[…]estimular a participação cívica dos membros das comunidades portuguesas, tendo como princípio orientador a Igualdade de Oportunidades entre todos os portugueses e todas as portuguesas, nomeadamente a Igualdade de Género, independentemente de serem ou não residentes em Portugal”.
Mais longe foi ainda ao trazer à luz do dia o papel, sempre tão envolto na sombra do anonimato, das mulheres migrantes, admitindo que as políticas que as chamam a uma linha da frente " [...] configuram uma dinâmica de valorização destas comunidades e de proximidade entre o Estado e as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo".
Proximidade que o governo, certamente, buscava, marcando presença e tomando a palavra naquele "Encontro", com um discurso muito assertivo. Em perfeita consonância com o programa do XVII Governo, que assinalava " […] a importância das políticas da igualdade não só para as próprias mulheres, mas para as comunidades e para o aprofundamento da estratégia de aproximação entre estas e o país". Todavia, para que o seu texto não ficasse letra morta, era imprescindível o esforço de comunicação com as pessoas, para que os destinatários do chamamento soubessem ao que eram solicitados, e tivessem a oportunidade real de aderir um bem urdida estratégia...
Lacão foi ao cerne da questão, ao lembrar que, aquém dos objectivos programáticos do governo, " [...] as mulheres se encontram sub-representadas nas instâncias de decisão dos movimentos associativos, pelo que os seus pontos de vista e necessidade se arriscam a não ser tidos em conta". E, de seguida, alistou o equilíbrio das componentes feminina e masculina na vida associativa e na das comunidades - ideia chave para a "paridade" - como essencial aos objectivos do próprio programa do governo: “ [...]a participação equilibrada de mulheres e homens no movimento associativo e nos seus órgãos de tomada de decisão, bem como nas suas comunidades, é condição essencial para a defesa dos direitos, bem como para uma tomada de consciência das suas necessidades". (Lacão, 2009:11)
A palavra ganhou, ali, de facto, força num acto de diálogo no interior de uma das maiores comunidades do estrangeiro, com mulheres e homens representativos do movimento associativo, onde estas teses praticamente nunca haviam sido afloradas, nem de uma forma espontânea, nem por parte do governo. Foi bem sublinhado o significado que se atribuía à acção das mulheres, para garantia de preservação das instituições, tanto quanto para alcançar melhores condições de defesa dos direitos e interesses individuais e colectivos.
3 - Neste e nos demais "Encontros " se pretendeu levar a efeito um levantamento o mais abrangente possível do posicionamento e da actuação cívica das portuguesas no mundo, com um propósito de estimular a mudança. Isto é, não apenas de constatar, mas de agir, ou interagir.
O Secretário de Estado das Comunidades acentuaria, em Joanesburgo, ao anunciar a preparação de um novo congresso mundial de mulheres emigradas, que "[...] estas iniciativas são um claro sinal da firme disposição do Governo de Lisboa em promover encontros mundiais [...] pela importância que atribui à necessidade de reforçar os laços com Portugal". (Braga, 2009:132)
A data desse novo congresso não está ainda fixada, o que nos deve suscitar várias interrogações: terão, ou não, continuidade estas formas de audição, regionais ou mundiais, ensaiadas durante todo um mandato governamental, de 2005 a 2009? Passarão pelo movimento associativo, pela colaboração com as ONG's, como se viu neste quadriénio?
Não é de modo algum seguro antecipar que sim - desde logo, porque o programa do actual Governo, no ponto referente a Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e Governo é, ao contrário do que acontecia com o anterior, omisso no que respeita à problemática da igualdade de género e às iniciativas, havidas ou a haver, na área das "Comunidades" e, bem assim, quanto à relevância genérica de parcerias com as ONG's, neste domínio particular. (16)
Será, preferentemente, pelo CCP, enquanto órgão consultivo, com uma componente mais significativa de mulheres, que passará o eixo central das políticas com a componente de género? Poderá uma tal composição reforçar, efectivamente, o interesse pelas temáticas da igualdade de sexo, de que o Conselho das Comunidades tem estado bastante alheado?
Só a resposta a estas perguntas, a obter dentro dos próximos anos, permitirá concluir se estamos, ou não, no limiar de uma estratégia para as comunidades portuguesas do estrangeiro, assente na chamada das mulheres à participação cívica igualitária.
V - MEDIDAS JURÌDICAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE NO SÈCULO XXI
1 – A norma que determina a aplicação do princípio da paridade, imposto nas eleições legislativa e autárquicas, à eleição do CCP (o nº 4 do artº 11º e a alínea a) do nº1 do artº 37º da Lei nº 66-A/207) é, no plano jurídico-político, uma medida excepcional de promoção da igualdade de género na história da emigração portuguesa, dando cumprimento da letra e do espírito da Constituição da República.
O anúncio da sua (então) próxima entrada em vigor foi feito na Conferência de Toronto por Jorge Lacão, como prova da vontade do governo de garantir a audição efectiva das mulheres num órgão onde sempre haviam sido uma pequeníssima minoria, e, na prática, sem acesso à sua instância de cúpula, o "Conselho Permanente". As listas para o CCP viriam, de facto, no ano de 2008, a assegurar, em observância da lei, a inclusão de um terço de mulheres. E como os actos eleitorais para a Assembleia da República e para as autarquias ocorreram no ano seguinte, acabou por constituir como que um "ensaio geral" do sistema de quotas - bem sucedido, pois redundou no aumento, que era previsível, do número e percentagem de conselheiras e, também, na sua ascensão ao Conselho Permanente.
A presença feminina, globalmente, no CCP, nas diversas Comissões e na instância de coordenação, é quantificável, com todo o rigor (sabendo-se que está ainda longe de uma verdadeira igualdade), mas a importância real que terá no maior equilíbrio de participação de ambos os sexos na vida das comunidades do estrangeiro vai depender, directamente, do uso que as eleitas farão da sua capacidade de influenciar os processos de funcionamento e de decisão do "Conselho", e, indirectamente, do papel que venha a ser o desta instituição - que tem tido, como afirmei, um percurso acidentado e irregular, enquanto forum de consulta do Governo e de representação dos emigrantes.
2 - Posterior à legislação que impõe a recomposição mais igualitária do CCP, bem como ao termo dos "Encontros para a cidadania", é uma tomada de posição da Assembleia da República sobre a "problemática da mulher emigrante", em forma de resolução - a Resolução nº 32/2010, de 19 de Março - que se situa no mesmo âmbito e visa o mesmos resultados das estratégias e acções governamentais que referenciei. Muito embora não lhes faça qualquer alusão, parece querer, objectivamente, dar-lhes seguimento, no futuro imediato... É no que se traduzirá uma ampla materialização do programa ali delineado, com o proclamado objectivo de "[…]definir um conjunto de medidas destinadas ao desenvolvimento da cidadania das mulheres portuguesas do estrangeiro".
Na realidade, o programa, nos seus traços gerais, é semelhante àquele a que a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, em conjunto com entidades da sociedade civil, levou a efeito nos "Encontros para a Cidadania" - e corresponde às principais propostas que neles foram avançadas. De resto, prevê a utilização de instrumentos e metodologias idênticas, apontando para a efectivação de "seminários, campanhas de sensibilização, acções formativas e informativas junto das comunidades, incentivos a estudos e investigações...
Na Resolução nº 31/2010, aprovada na mesma data, os parlamentares recomendam ao Governo que " […] proceda ao estudo quantitativo e qualitativo da nova diáspora portuguesa do mundo.” E fazem sua uma ideia chave do Programa do XVII Governo (que o actual certamente não enjeitará)): a de preparar as medidas da sua política externa, em concertação com outros ministérios, "[…]no sentido de revelar uma mudança de paradigma face a esta nova diáspora portuguesa, colocando-a no centro das suas acções, fazendo dela uma verdadeira linha avançada da nossa diplomacia um pouco por todo o mundo”.
Todavia, curiosamente, no seu texto, nem o já existente Observatório da Emigração é objecto de qualquer juízo, nem a ausência de enfoque na estimativa e avaliação das migrações femininas é objecto de preocupação, como seria de esperar por parte de quem, longa e detalhadamente, se debruça, logo de seguida, sobre a protecção dessas migrações, na Resolução nº 32/ 2010…
Resolução esta que se destina a contribuir para “ o desenvolvimento da cidadania das mulheres portuguesas residentes no estrangeiro “, visando: “Promover a igualdade efectiva entre homens e mulheres no universo das comunidades portuguesas no Mundo; Combater situações de violência de género; Desenvolver modalidades de inserção profissional das mulheres portuguesas no estrangeiro”. (Ponto 2, alíneas a), b) e c))
Objectivos, todos eles, traçados no programa do actual governo, no capítulo respeitante às políticas sociais de igualdade de género, porém, sem qualquer referência expressa ao caso das mulheres expatriadas, pelo que não será desapropriado concluir que a "Resolução" procura afectar ou transpor o conteúdo das medidas ali delineadas, em termos gerais, para a situação particular das emigrantes. Ou seja, os parlamentares conseguem, deste modo, colmatar a omissão, que se detecta num documento de incontestável relevância política – o que é clarificador, mesmo que da lacuna ninguém pretenda tirar um argumento a contrario…
Este é, pois, um normativo programático, cuja execução está perfeitamente ao alcance de governantes que já deram passos na boa direcção.
A Resolução não é, evidentemente, muito inovadora, pelo que recomenda. É-o pelo facto de a Assembleia da República se ter ocupado da matéria. Isto é, vale, também, pela sua carga simbólica, humanista (ou feminista, hoc sensu).
É a primeira vez que a questão de género na emigração tem uma tal focagem na Assembleia da República, fora de um processo de revisão constitucional – a primeira vez que os Deputados chamam a atenção para os deveres do Estado na consecução da igualdade de mulheres e homens, para além das fronteiras territoriais, como manda o art.º 109º da Constituição. E – o que também é de salientar - cometem essa responsabilidade, directamente, ao "membro do Governo competente para o acompanhamento da política relativa às comunidades portuguesas".
Se a resposta do Executivo consistir em relançar, de uma forma constante e consistente, o trajecto de diálogo e cooperação já empreendido - sem que tenha ainda atingido a generalização, a eficácia plenas, a exigir esforço incessante, sem fim à vista - estaremos no limiar de efectivação de políticas de emigração, com a componente de género.
NOTAS
(1) O Estado, de um modo geral, privilegiou, de jure e de facto, a emigração de homens sós, assim como a miscigenação consentida ou encorajada nas colónias, a fim de reter no Reino as mulheres... E terá sido à atitude de desafio destas “viúvas” de maridos vivos, que decidiram partir aos seu encontro dos ausentes, que se ficou, fundamentalmente, a dever a matriz cultural portuguesa dessas colónias de povoamento. Segundo Boxer, a Coroa Portuguesa terá sido, geralmente, mais permissiva no que respeita â saída de mulheres para o Brasil, do que para África ou o Oriente.
(2) Maria Engrácia Leandro foi uma das primeiras investigadoras a evidenciar formas desta insuspeitada realidade, tendo centrando os seus estudos nas comunidades portuguesas da região parisiense.
(3) É certo que algumas medidas pontuais se podem destacar. Um exemplo: aquando da adesão de Portugal à CEE, no âmbito das comparticipações comunitárias, a SECP organizou diversas acções no domínio da formação profissional destinadas a mulheres - o que constituiu uma diligência pioneira, ainda que desenvolvida num universo limitado, e, por isso, sem decisivo impacte na vida da generalidade das portuguesas.
(4) A Lei nº37/81 de 3 de Outubro foi, a meu ver, descaracterizada, pela via da regulamentação, que admitia, inclusive, a oposição do Estado em processo de reaquisição da nacionalidade pela mulher casada com estrangeiro. A Lei Orgânica nº1/2004 de 15 de Janeiro, no art. 30º veio permitir a recuperação da nacionalidade, por mera declaração. Na parte final do nº2º do mesmo artigo estipula-se que a reaquisição "[…]produz efeitos desde a data do casamento".
(5) Afirmações do sociólogo Eduardo Victor Rodrigues, proferidas no encerramento do, Encontro “Cidadãs da Diáspora”, em Espinho, tiveram eco nos media das comunidades, nomeadamente no Canadá. Citamos um artigo de 9 de Março de 2009 do jornal "Voice", intitulado justamente "Mudanças nos Hábitos dos Emigrantes Portugueses".
(6) No primeiro comunicado de imprensa sobre os "Encontros para a Cidadania" dizia-se, expressamente, que um dos seus objectivos era "o cumprimento do programa do XVII Governo (capítulo V, ponto 7) ".
(7) Não é nova a preocupação de estimar e analisar, de forma sistemática, os movimentos migratórios nacionais. Portugal participou, activamente, desde os tempos do "Secretariado Nacional da Emigração", no Serviço de Observação Permanente das Migrações - SOPEMI - da OCDE – colaboração a que, na década de 80, era ainda dada uma grande importância.
(8) Nos "Encontros Para A Cidadania", sobretudo nos de Buenos Aires e de Estocolmo, foi insistentemente avançada essa recomendação. Tendo sido, em data posterior, criado o Observatório da Emigração, para evitar dispersão de esforços, o mais razoável parece ser agora uma insistência para que nele se venha a incluir o estudo das particularidades das migrações femininas. Objectivo necessário, visto que, pela força da desocultação de disparidades e injustiças, se poderá desencadear a alteração de mentalidades e atitudes.
(9) Estas declarações de António Braga são parte de uma entrevista transcrita na publicação sobre o "Congresso online", promovido em 2009 pela “ Mulher Migrante”. Um quarto de século antes, já a Secretária de Estado da mesma pasta, eu própria, encerrara o Encontro de Viana com um discurso semelhante, notando, no que às mulheres respeita, "[...] ausência de participação, de voz, de reconhecimento, de poder, ao menos de poder formal, nas instituições [...]" como consta das actas do "1º Encontro" editadas pelo Centro de Estudos. São, pois, posições concordantes, embora separadas por um longo hiato de duas décadas de inacção política, nesta área ...
(10) A génese dos Encontros para a Igualdade, vem sumariada, num artigo com esse título, na edição sobre "O Congresso on line".
(11) "Jornalismo" considerado no seu sentido mais amplo, incluindo profissionais, correspondentes de meios de comunicação de âmbito europeu ou universal, como a “BBC”, a “Radio France Internacional”, os maiores quotidianos parisienses, a americana “CBS”, a par de produtoras ou directoras e colaboradoras de programas "étnicos" ou das próprias comunidades portuguesas.
As trinta e cinco participantes - das quais 14 jornalistas - procediam de dez países, dos cinco continentes, com predominância das do norte da América, Canadá e EUA e, sobretudo, da Califórnia, onde o associativismo feminino tem uma existência quase centenária. A publicação sobre o "1º Encontro de Portuguesas Migrantes no Associativismo e no Jornalismo" (1986) incluiu os curricula e a síntese das comunicações.
(12) Nas conclusões, in fine as participantes quiseram marcar esse carácter pioneiro, ao destacarem o seguinte: " […]Não se tem conhecimento que algum país de emigração tenha alguma vez organizado um Encontro deste tipo. As mulheres portuguesas no estrangeiro tiveram voz, usaram-na e partiram animadas por uma nova vontade de fazer. Em Portugal ficou o eco do que disseram".
Na verdade, nem governo nem as convidadas para o "Encontro" tinham modelo estrangeiro, no qual buscar inspiração - salvo em iniciativas padronizadas no homem migrante... Como é sabido, na Europa, são, sobretudo, os países do sul, e, mais recentemente, alguns do leste europeu, os que prosseguem políticas de acompanhamento das suas comunidades oriundas das migrações, e, por isso, em oitenta, era reduzido o leque daqueles que poderiam ter precedido Portugal na abertura a este tipo de audição...
(13) Uma outra das conferências, a de "Assuntos Económicos" foi proposta por empresários de Paris, que se deslocaram a Portugal, para audiências solicitadas ao Presidente da República e Governo. Não assim a destinada à promoção da participação das mulheres, mas, em qualquer caso, não se punha em dúvida a receptividade que teria no "grupo de Viana" e, de um modo geral, nas mulheres mais envolvidas na vida das suas comunidades. Uma breve referência às conferências é feita na publicação "Mulher Migrante - O Congresso on line" (p.8).
(14) A saída de cena política desse primeiro CCP marca definitivamente o fim de um ciclo. Ficou, contudo, viva a experiência de colaboração estreita entre o Estado e o universo associativo em projectos partilhados. A "Associação Mulher Migrante", converteu-se, desde a meia década de 90, num parceiro preferencial de vários departamentos governamentais, com competência neste sector. Primeiramente, a "comissão para igualdade", sedeada no Conselho de Ministros (cuja designação foi variando, sem que isso implicasse descontinuidade na cooperação) e não a SECP, indício de que não dava sinais de receptividade para esta problemática, por muito instada que fosse a actuar...
(15) Na organização dos “Encontros”, a par da "Mulher Migrante" estiveram a Fundação Pro Dignitate, através da Doutora Maria Barroso, Presidente de Honra dos "Encontros", a Universidade Aberta, o "CEMRI", a "Rede Jovem para a Igualdade" e, em cada comunidade, uma ou várias ONG's responsáveis pela implementação do projecto: na América do Sul, a Associação Mulher Migrante Portuguesa da Argentina; na Europa, a federação "PIKO", com sede na Suécia: no Canadá, a "Working Women" e outras, com particular envolvimento da Cônsul Geral de Portugal; na África, a "Liga da Mulher Portuguesa"; nos EUA, o departamento de português da Universidade de Berkeley.
(16) A omissão contrasta com a relevância que é dada a parcerias com as ONG's em sede de cooperação, no ponto referente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. (Programa do XXVIII Governo, p. 127). Por outro lado, o "Programa de Governo", nesse mesmo ponto, não faz alusão a qualquer forma de diálogo com a "metade feminina" das comunidades – na unidade de um texto em que destaca o carácter estratégico do diálogo com a Juventude.
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