segunda-feira, 7 de setembro de 2009

José Machado A CRISE NO MOVIMENTO ASSOCIATIVO NAS COMUNIDADES PORTUGUESAS

Um Pouco de Historia e de Futuro...
O movimento associativo das comunidades portuguesas acompanhou a existência e a evolução dos portugueses na Diáspora. A legislação dos países de acolhimento e os diversos contextos políticos e sociais existentes, iam moldando as associações que os portugueses foram criando ao longo de mais de um século.Assim, os portugueses de França, tiveram enormes dificuldades em criar associações:
- Antes de 1974 A Ditadura existente em Portugal estendia os seus tentáculos no seio das comunidades portuguesas, tornavam suspeitos todos os cidadãos tentados em criar associações, nem que fosse com as “melhores intenções do mundo”Assim se explica o número impressionante de associações criadas em França, após 1974 e o derrube da Ditadura. os chamados “emigrantes económicos” (para os diferenciar dos exilados políticos...), que podiam regressar todos os anos de férias a Portugal, passaram a poder criar associações, sem temerem por eles e suas famílias.- Depois de 1981 A vitoria de François Mitterrand teve como consequência a total liberdade de os estrangeiros poderem beneficiar da Lei 1901 (que regulamenta as associações) sem os entraves impostos pelo Decreto-lei que, após a 2 a Guerra, lhes limitava a liberdade de criação de associações. Até essa data, os portugueses, para contornarem a Lei, arranjavam um amigo francês que fizesse de “Presidente” e a legalização da associação era conseguida sem dificuldade. Depois de 1981, essa liberdade associativa, trouxe um novo fluxo de associações no seio da comunidade portuguesa.
Noutros países do mundo, no Brasil durante a Ditadura, na África do Sul durante o “apartheid”, na Argentina ou na Grécia sob o jugo dos “coronéis”, também, certamente, a criação de associações e as suas actividades foram condicionadas pelas situações politicas e sociais que dai decorriam.
No seio da Diáspora, os portugueses foram criando, ao longo dos anos e conforme as fases da sua evolução sociológica e integração no país de acolhimento, associações de múltiplas características: De Solidariedade
Importantes no início da chegada, quando era preciso arranjar trabalho, casa e escola para os filhos (quando estes vinham antes do reagrupamento familiar).Importantes nas situações de privação de liberdades, em Portugal ou nos próprios países de instalação, em que era preciso socorrer, esconder, denunciar, lutar...
De Cultura e Ensino
Certamente as mais numerosas. Dedicaram a sua actividade à criação de cursos de português, na própria associação ou integrados nos sistemas de ensino locais.A aprendizagem da língua foi sempre, para os portugueses, uma forma de resistência à assimilação forçada e à perca da identidade cultural, na qual a língua é o esteio principal.Também se organizavam grupos de teatro em língua portuguesa e de autores portugueses, assim como exposições e diversas manifestações culturais relativas a Portugal, onde o Fado também teve muita importância.De Folclore. A criação e a existência das centenas de Ranchos Folclóricos, somente pode ser explicada pelo facto dos primeiros emigrantes terem uma origem rural que marcou profundamente a forma da sua existência no estrangeiro. O Folclore foi sempre também uma forma viva e dinâmica de manter viva a identidade cultural, além de ser uma forma de promoção das terras de cada um. Os Grupos Folclóricos foram e são ainda um esteio fundamental das associações da Diáspora. De destacar aqui, o extraordinário trabalho realizado pela Federação do Folclore Português – sob a presidência de Augusto dos Santos – na dignificação dessa actividade e na solidificação das associações que divulgaram o Folclore português, um dos mais ricos e preservados do mundo.
De Acção Cívica.
As amis preocupadas pelo deficit de participação politica e cívica dos portugueses no pais de acolhimento e em Portugal. Estas associações nasceram quando uma parte dos emigrantes portugueses se apercebeu da importância das inscrições dos portugueses no recenseamento eleitoral consular e nas listas complementares (para a Europa), como consequência do Tratado de Maastricht que facultou o direito de voto nas eleições autárquicas no espaço comunitário. Essas associações foram criadas também para lutar contra a diminuta representação parlamentar das comunidades portuguesas, com apenas 4 Deputados para toda a Diáspora.
Foram essas associações que organizaram, sobretudo a partir dos anos 1990, as campanhas de sensibilização e de mobilização sobre esses temas.De Jovens. Foram já à iniciativa dos primeiros filhos dos emigrantes – a chamada “segunda geração” – e já tinham motivações diferentes das associações criadas pelos seus pais. Em vez de Folclore, já se preocupavam com questões e actividades mais citadinas. Na música preferiam o Rock ao Folclore (isto em geral, porque muitas também se criaram em volta de um Folclore preocupado pela qualidade da sua representação), e por actividades culturais mais marcadas pelo moderno que pelo tradicional.
De carácter Federativo
Foram as associações mais preocupadas em conseguir uma “relação de forças” mais favorável às comunidades portuguesas face ao país de acolhimento e a Portugal.Seguindo o lema “ A União faz a Força” essas associações organizaram-se colectivamente, dando uma outra dimensão às suas actividades e um outro impacto social e politico às suas tomadas de posição.
Na Europa, o fenómeno federativo é muito mais recente que na chamada “ emigração transatlântica” e em particular no Brasil. As “ politicas”Nasceram antes do “25 de Abril”, animadas por militantes de esquerda, socialistas ou comunistas (sobretudo os últimos, mais “antigos na emigração e no exílio). Eram apoiadas pelos Partidos de Esquerda locais, que lhes punham à disposição os locais e meios materiais de funcionamento. Serviram de “organizações de massas” para recrutamento de militantes e participavam na acção dos Partidos do pais de acolhimento, além das acções de resistência à Ditadura.
As da “Memoria”
Como é óbvio, estas nasceram quando a história da epopeia da emigração passa a ser uma recordação, em vez de uma realidade. Elas não aceitam que a historia de Portugal se faça, ocultando a historia de mais de um terço da sua população: a historia das Comunidades Portuguesas no Mundo. Na Europa, foi também após os anos 1990, que se começou a verificar o aparecimento das primeiras associações preocupadas em obter ou construir locais de maior dimensão, consequência de uma certa antiguidade da condição de emigrante e de uma consequente “integração social”. Este fenómeno já tinha sido vivido na emigração portuguesa das “Américas”, particularmente no Brasil, mas também na Venezuela, na Argentina, no Canada... Essas sedes sociais, exigiam ja uma organização diferente das associações, devido à gestão quotidiana desses locais e à sua importância no tecido social local.
Em França, a construção da Casa de Portugal em Plaisir, inaugurada em 1995, foi, para muitos de nos – também pelo facto de ter sido construída após uma Campanha de Recolha de Fundos no seio da Comunidade Portuguesa da Região Parisiense – o inicio de um processo de resposta à crise do movimento associativo, que já nesses anos se adivinhava e se acelerava inexoravelmente. O projecto dessa Casa, além de prever no seu Projecto Cultural diversas inovações (por exemplo a organização trimestral de manifestações culturais em colaboração com as Regiões de Turismo de Portugal, para a sua divulgação e das suas realidades culturais e económicas...), deixava adivinhar a solução para a dispersão das associações e para a diminuição acelerada de quadros associativos (benévolos) para se ocuparem da sua gestão. A intenção era de se adaptar à organização administrativa francesa, organizada em Departamentos, criando em cada um desses Departamentos uma Casa de Portugal, concentrando assim forças e meios, e dando nascimento a uma rede associativa espalhada por todo o país.
Para a comunidade portuguesa e para Portugal, essa teria sido, sem duvida, a “grande revolução” capaz de fazer perdurar o espírito associativo, as suas actividades, a presença de Portugal e a promoção da sua imagem, da sua língua e, até, da sua economia.Mas, na minha opinião, esse é ainda o caminho a seguir, se quisermos evitar o desaparecimento inelutável e próximo da maior parte das associações portuguesas no mundo.
Além dessa perspectiva, que Portugal deveria prioritariamente apoiar e negociar com os países de acolhimento para a sua concretização, outras condições são necessárias para responder à situação de crise existente.As redes, diplomática e consular, poderão ser um instrumento fundamental na coordenação de muitas actividades, no apoio a outras e na ajuda à formação associativa dos animadores das associações. Para tal, os consulados e embaixadas devem dar uma outra atenção ao movimento associativo das comunidades, prevendo nos seus quadros, funcionários conhecedores, dedicados e competentes na prossecução desses objectivos.Para tal, também, as receitas dos emolumentos consulares, deveriam ser utilizadas prioritariamente para o financiamento de tais projectos de reestruturação do movimento associativo, em vez de utilizadas em favor dos diplomatas, das suas actividades e das suas famílias. Para tal, são fundamentais as negociações de Portugal com os países de acolhimento, no quadro das Comissões Mistas ou no quadro da Europa, no sentido de os sensibilizar para essa realidade, partilhado com eles essa preocupação e os custos inerentes das respostas a dar. Para tal, é fundamental a acção dos chamados “ Deputados da Emigração” no seio das comunidades, alargando o seu número e fazendo de cada um deles o defensor de um projecto colectivo de mudança e de reestruturação associativa. Para tal, será necessário edificar uma estrutura associativa de dimensão mundial, apoiada numa rede associativa unida em volta de um projecto associativo, cultural e cívico mobilizador.
Tal estrutura será, forçosamente, diferente e paralela ao chamado “ Conselho das Comunidades”, o qual, se assim o entender a pode apoiar. Ela terá de ser independente do poder político, para poder sobreviver às mudanças politicas operadas em Portugal. Ela terá de obter os apoios, institucionais e privados, necessários ao seu desenvolvimento. Para tal, em Portugal, devem ser desencadeadas as acções necessárias, para que mude a mentalidade, na sociedade e na “classe politica”, depreciativa em relação aos portugueses emigrantes.
A própria Assembleia da Republica deveria dar o exemplo que se impõe, prevendo na sua actividade parlamentar, a organização de uma Jornada Parlamentar, dedicada às Comunidades Portuguesas e à sua realidade social, cultural e politica. Para tal, deveria ser impulsionada, no quadro da Europa (para as associações desse espaço que cobre mais de metade das associações portuguesas existentes no mundo) pelos nossos Deputados Europeus ou da “emigração” uma politica de apoio à vida associativa e de Formação de Dirigentes e de Animadores Associativos.(1)

José Machado
Vice-Presidente da APE
Presidente Honorário da FAPF
Ex-Presidente do Conselho Permanente do CCP

(1) Estas são algumas das observações que me deixei à apreciação da Convenção das Comunidades 2008, organizada pela APE, na cidade de Santa Maria da Feira, em parceria com a Câmara Municipal da cidade.

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